Maior
termelétrica com combustível renovável é inaugurada em São Paulo
- 16/09/2016 08h45
- São Paulo
Camila
Boehm – Repórter da Agência Brasil
A usina
Termoverde Caieiras - Divulgação/TermoverdeTermoverde Caieiras/Divulgação
A maior termelétrica do Brasil
movida a combustível renovável – gás procedente de aterro sanitário – será
inaugurada na manhã de hoje (16), na cidade de Caieiras, na Grande São Paulo. A
Termoverde Caieiras tem potência instalada de 29,5 megawatts (MW) e gera
energia renovável a partir do lixo depositado em aterro, que libera o gás
metano, usado como combustível para a termelétrica.
O gás metano, também encontrado
como combustível fóssil, é chamado biogás quando obtido a partir da
decomposição de alguns tipos de matéria orgânica como resíduos agrícolas,
madeira, bagaço de cana-de-açúcar, esterco, cascas de frutas e restos animais e
vegetais.
Considerando possíveis perdas, a
média para a geração de energia deve chegar a 26 MW por hora, o que é o mesmo
consumido por uma cidade de 300 mil habitantes, como o Guarujá, Taubaté ou
Limeira.
Os aterros sanitários geram muito
metano, que é um dos gases do efeito estufa. Antes da utilização para a geração
de energia, esse metano era queimado em flare, que é um sistema de
queima controlada capaz de transformá-lo em gás carbônico (CO2), com potencial
de aquecimento global cerca de 20 vezes menor que o metano. Agora, com a
termelétrica, além de evitar que o metano seja liberado na atmosfera, ele será
transformado em energia elétrica.
“O primeiro processo, que é o de
evitar a emissão de gás de efeito estufa, já estava sendo garantido. Mas
faltava um fim mais nobre nesse processo”, disse Carlos Bezerra, diretor da
Termoverde Caieiras, do grupo Solvi. Segundo ele, o projeto só foi possível com
o incentivo dos governos federal, por meio do Regime Especial de Incentivos
para o Desenvolvimento da Infraestrutura (REIDI), e estadual, pela isenção do
Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).
“É sustentável, é uma excelente
opção. Na medida em que você está captando biogás e queimando, de alguma forma,
para não jogar na atmosfera, esse biogás já é absolutamente sustentável. Melhor
ainda quando você está usando para um fim energético”, afirmou a professora
Suani Teixeira Coelho, coordenadora do Grupo de Pesquisa em Bioenergia (Gbio), do
Instituto de Energia e Ambiente (IEE-USP).
Ela acrescentou que a técnica é
pouco utilizada por falta de viabilidade econômica. “Os empreendedores, muitas
vezes, acham que o custo dessa eletricidade não é baixo que ele consiga depois
comercializar”, disse.
Geração descentralizada
“Se olharmos só para esse número
- 30 megawatts -, as pessoas podem achar pequeno, porque têm [a usina
hidrelétrica de] Itaipu, que gera 11 mil MW, mas é justamente a nova proposta
energética, em termos até mundiais, da chamada geração descentralizada, quer
dizer, são feitas pequenas gerações em vários produtores, que têm uma logística
muito mais fácil”, explicou Suani.
Para transmitir a energia gerada
em Itaipu, localizada na fronteira entre o Brasil e o Paraguai, há uma grande
linha até a cidade de São Paulo. A professora ressaltou que, se há algum
problema nessa enorme linha de transmissão, toda a cidade fica no escuro. “Como
já aconteceu no passado, nós tivemos um blecaute em São Paulo, de três horas,
na cidade toda, porque caiu o 'linhão' de Itaipu inteiro”.
Segundo ela, uma geração de
energia descentralizada, a partir de aterros ou de usinas de açúcar que usam o
bagaço da cana, evitariam um apagão como aquele. “Além disso, você está perto
do ponto de carga [onde haverá consumo]. No Brasil, o maior consumo de energia
está na Região Sudeste, então, quando você está gerando energia elétrica aqui
no Sudeste, você não precisa usar linhas de transmissão”, acrescentou.
Outra vantagem citada por Suani é
a possibilidade de substituição da energia de origem fóssil pela renovável. A
energia antes gerada por uma termelétrica a diesel ou a carvão poderá ser
substituída por aquela gerada a biogás.
O diretor da termelétrica lembrou
que a Termoverde gera crédito de carbono. “Eu gero crédito de carbono pela
queima, pela destruição [do metano] e também por gerar uma energia renovável e
não uma fóssil. Estou colocando na matriz energética uma energia renovável em
vez da fóssil”.
Protótipo
O Centro Nacional de Referência
em Biomassa (Cenbio) do IEE-USP desenvolveu o mesmo projeto, porém em menor
escala, entre 2006 e 2009, com financiamento do Ministério de Minas e Energia,
com o objetivo de implementar um sistema de geração de energia elétrica e de
iluminação a partir de biogás procedente do tratamento de resíduos sólidos urbanos em
aterro sanitário.
O aterro sanitário selecionado
foi o mesmo que hoje inaugura a termelétrica, com significativa potência instalada.
Na época, o estudo concluiu o que atualmente a Termoverde vê na prática: “a
geração de energia elétrica, proporcionando ao aterro economia em relação aos
gastos com a energia elétrica adquirida da rede, proveniente da concessionária
local, além de possibilitar a obtenção e comercialização dos créditos de
carbono e receita com a venda da energia excedente”.
Um novo estudo, em que a
professora está envolvida, calcula o potencial de geração de energia elétrica
no estado de São Paulo a partir do biogás de aterro. “Se conseguíssemos que
todo o lixo de São Paulo fosse para aterros sanitários e todo esse lixo fosse
usado para conversão de energia, a gente podia ter até cerca de 500 MW gerados
com a população de 2016 no estado de São Paulo”, disse. Isso seria quase 17
vezes mais do que a Termoverde tem capacidade de gerar.
Resíduos sólidos
O presidente do Instituto
Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), Carlos Bocuhy, vê a estratégia de
transformação do metano em energia elétrica como medida paliativa para um
problema maior, que é a destinação dos resíduos sólidos no país.
“A solução é a implementação dos
princípios da Política Nacional de Resíduos Sólidos. Há cinco anos ela deveria
ter sido implementada, seria a melhoria da cadeia produtiva, reduzindo no final
tudo aquilo que é produzido hoje como lixo e tudo, no fim da cadeia produtiva,
passaria a ser passível de reciclagem”, argumentou.
A disposição de resíduos no
Brasil e no mundo, de acordo com Bocuhy, tem que passar por uma transformação,
impedindo que ocorram processos que gerem gás metano e que depois seja
necessária sua queima. “É um problema estrutural. Estão utilizando a
termelétrica como forma de amenizar o impacto daquilo que já foi feito”,
acrescentou.
Edição: Graça
Adjuto
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