Montevidéu inaugura
praça em homenagem às mulheres pioneiras
Diretora de grupo
de carnaval uruguaio será uma das homenageadas
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Publicado em
07/03/2020 - 15:49 Por Marieta Cazarré – Repórter da Agência Brasil -
Montevidéu
Iniciando as comemorações pelo Dia Internacional da Mulher, a prefeitura
de Montevidéu inaugura hoje (7), às 17h, a praça Las Pioneras, uma homenagem
àquelas que lutaram para que todas pudessem exercer seus direitos civis e
políticos plenamente.
Uma das homenageadas é Juanita "Pochola" Silva, 83 anos,
cabeleireira aposentada. Em 1962, ela foi a primeira diretora de uma
"murga" no Uruguai. As murgas são grupos tradicionais do carnaval,
que se fantasiam com roupas coloridas e maquiagens extravagantes e cantam
músicas de temáticas políticas e sociais, normalmente satíricas. Até o dia de
hoje, as murgas são compostas majoritariamente por homens.
Em conversa com a Agência Brasil, Juanita
"Pochola" Silva, radicada em Buenos Aires, contou que está muito
feliz pelo fato de que, ainda hoje, se lembrem dela.
"O meu irmão, desde que tinha 12 anos, participava das murgas. E eu
sempre amei as murgas. Um dia eu estava com umas amigas, vizinhas, primas,
escutando a murga do meu irmão e eu disse: tchê, e se fizermos uma murga? Então
minha mãe me disse: vá à costureira fazer a roupa! E assim começou, eu me
inscrevi, fizemos as letras com o meu irmão e eu saí, contentíssima",
contou Pochola.
Nas murgas, diferentemente do carnaval tradicional brasileiro, os grupos
se apresentam nos tablados, que são teatros ao ar livre, onde o público fica
sentado, assistindo as apresentações musicais. Para participar de uma murga é
necessário fazer a inscrição na prefeitura da cidade.
Juanita "Pochola" Silva
apresenta sua murga em Montevidéu na década de 60 - Arquivo
pessoal/Juanita
Expressão centenária
Juan Castel, gerente do Centro de Documentação e Investigação do Museu
do Carnaval do Uruguai, explicou à Agência Brasil as
características principais da murga.
"É um carnaval de cenário, a categoria mais popular e a mais
representativa do Uruguai. Tem uma formação de 17 pessoas que cantam em coro,
acompanhadas de uma banda de murga composta por bumbo, pratos e bateria. O coro
apresenta uma cena que tem no máximo 45 minutos, com grande presença cênica, um
jeito específico de cantar, com um timbre muito particular, muito forte. E o
que a murga gera através de seu canto e de seus versos é criticar, fazer rir e
emocionar, por isso mesmo está muito dentro do coração das pessoas e é tão
representativa. A murga canta o que o povo quer escutar e critica os
personagens do momento, os políticos. E tem sempre um toque nostálgico. Essa
formação da murga tem uns 100, 110 anos de vida, e é uma das formas culturais
mais forte do Uruguai", explicou Juan.
Em relação ao vanguardismo de Pochola, Juan Castel explica que a murga
historicamente foi um reduto masculino.
Juanita "Pochola" Silva é
uma das homenageadas pela praça Las Pioneras - Arquivo
pessoal/Juanita
"Pela forma de cantar, pela conformação histórica da murga, por
como era a sociedade, sobretudo na primeira metade do século 1920, sempre foi
um lugar de homens. Recentemente, nos últimos 10 anos, começou a ser mais
habitual a aparição de mulheres cantando murgas. É uma mudança que está
acontecendo. Historicamente, há uns poucos casos isolados de mulheres, mas o
valor que tem Pochola Silva e sua murga Rumbo al Infierno (Rumo
ao Inferno, em tradução livre), é que foi a primeira murga de mulheres que
competiu no carnaval de Montevidéu, por isso tem essa importância. Numa época
como na década de 60, quando era muito difícil a participação da mulher nesse
tipo de manifestações, que aparecesse uma murga de mulheres era muito raro,
realmente".
"Pochola" Silva foi a diretora da murga Rumbo al
Infierno, aos 26 anos de idade. Ela e suas companheiras saíram às ruas nos
carnavais de 1962 a 1964.
Pochola conta que, apesar de ser algo novo àquela época, elas não
sentiam que houvesse uma grande resistência da sociedade. "Preconceitos
existiam, como em todos os lados, mas nunca nos ofenderam. Sempre desfrutamos
muito. E havia muitos tablados para a gente se apresentar! Você pode imaginar a
quantidade, pois era uma novidade naquela época! Aliás, segue sendo uma
novidade até hoje".
Praça Las Pioneras
Localizada na Avenida Agraciada, a nova praça surge a partir de um
edital público feito em 2018 pela prefeitura da capital uruguaia. O projeto
aprovado tinha como ideia promover, a partir da desconstrução de um edifício
existente, um novo local de convivência, que reconhecesse e prestasse
homenagens às mulheres pioneiras do país. O novo espaço se distingue das
configurações tradicionais de uma praça, na tentativa de trazer novas maneiras
de convívio social.
A partir das 17h, a praça receberá uma feira gastronômica. Haverá também
oficina de circo para as crianças, além de atividades de artes plásticas,
escrita e compostagem, entre outras.
Às 20h, será assinado um convênio entre a prefeitura de Montevidéu e a
Assembleia de Coletivos Feministas. Em seguida, haverá um vídeo mapping, que
consiste na projeção de vídeo em superfícies irregulares, como estruturas de
grandes dimensões e fachadas de edifícios, realizado pela artista visual Cabe
Trust, em homenagem às mulheres que inspiraram a luta feminista.
Depois, haverá shows com a participação da artista montevideana de hip
hop, Eli Almic, além da DJ Fuega. Haverá também um espetáculo da murga Falta
y Resto, uma das mais tradicionais do país, que prestará uma homenagem à
Juanita "Pochola" Silva.
Edição: Fábio Massalli